A economia globalizada comprimiu distâncias geográficas, cindiu barreiras culturais e proporcionou um admirável mundo novo de oportunidades. Mas também comoditizou tudo: produtos, serviços e até pessoas.
Por isso, a competitividade está lastreada num processo de diferenciação. Praticar o que chamamos de concorrência monopolística, ou seja, atuar num ambiente altamente concorrencial, porém com características tão peculiares que geram encantamento e fidelização.
O caminho para a diferenciação é dado pela criatividade, o ato de dar existência a algo novo, único e original. Também podemos definir criatividade como uma técnica de resolver problemas.
A criatividade se manifesta de duas formas básicas. Como bem pontuaram Duailibi e Simonsen, em Criatividade & Marketing, a primeira é a descoberta, a qual ocorre quando se percebe algo já existente e se verbaliza esta constatação, seja através de uma definição, uma equação ou uma fórmula matemática.
A segunda é a inovação. Através da associação de dois ou mais fatores aparentemente díspares, chega-se a um terceiro fator que tem parte dos anteriores, mas que, em relação a eles, é novo.
É sobre inovação que vamos tratar neste ensaio baseado no filme “Os Radicais Livres da Inovação”, produzido pelo Centro de Inovação de Oregon e distribuído com exclusividade no Brasil pela Siamar.
A metáfora dos radicais livres advém da Biologia. Assim como nosso organismo registra a existência de muitos radicais livres essenciais ao metabolismo, mas que também provocam câncer e outras doenças, nosso futuro depende da inovação, que freqüentemente é negligenciada devido aos seus riscos inerentes que asfixiam a criatividade.
Faremos a seguir um passeio por um conjunto de conceitos com um objetivo bem definido: sensibilizar você e sua empresa sobre a importância da inovação, apresentando instrumental suficiente para entendê-la, cultivá-la e promovê-la em sua organização e em sua vida.
1. Inovar ou morrer
“Não é a mais forte das espécies a que sobrevive, nem a mais inteligente,
mas aquela que melhor responde às mudanças.”
(Charles Darwin)
A inovação se posiciona ao lado do empreendedorismo como o grande motor para o desenvolvimento econômico sustentável de empresas e nações.
A máxima darwinista serve-nos para rememorar o pensamento de Heráclito de Éfeso que dizia: “A única coisa permanente é a mudança”.
O cemitério do mundo corporativo está repleto de companhias que, encasteladas em seus dogmas, acomodadas pelos ganhos de participação no mercado e aumento dos lucros, não perceberam que se tornavam obsoletas.
Assim foi com fabricantes de chicotes para charretes, que poderiam ter se convertido em empresas de controle veicular, e fabricantes de máquinas de escrever, que poderiam ter desenvolvido os primeiros processadores de texto.
Não foi assim com a Sony, que após lançar seu rádio transistorizado de bolso em 1957, definiu-se como uma empresa capaz de desenvolver equipamentos portáteis individuais de música, atingindo seu auge com o walkman que a permitiu reinar soberana por quatro décadas. Mas no meio do caminho tinha uma Apple, e esta tinha um novo dispositivo: o iPod.
2. Reinventar o Marketing tradicional
“Inventar um avião não é nada.
Construir um é alguma coisa. Voar é tudo.”
(Otto Lilienthal)
O famoso composto mercadológico formado por 4P’s também evoluiu. Aos convencionais produto, preço, praça e promoção, outros P’s foram adicionados. A Madia Marketing Matrix, desenvolvido pela Madia Marketing School, trabalha com um conjunto de 11 P’s. Neste ensaio, com foco em inovação, abordaremos os seguintes:
Produto
Sim, começamos por ele, até por conta do paradigma de que a inovação está relacionada à tecnologia. O objetivo aqui é criar produtos mais funcionais e surpreendentes. Foi assim que os televisores abandonaram o tubo, migrando para a tecnologia plasma e LCD. Os tênis ganharam amortecedores de impacto. As geladeiras passaram a fornecer cubos de gelo na porta sem a necessidade de abri-la. E os celulares tornaram-se aparelhos multimídia.
Curiosamente, e até por conta da velocidade das inovações, a expressão “bens duráveis” está com os dias contados. Os equipamentos de hoje não são definitivamente construídos para durar. Nossos avós entendem bem o que isso significa.
Preço
Produtos reinventados para atender consumidores solteiros, com embalagens menores e preços mais acessíveis. Condições de pagamento elásticas, ofertadas em parceria com instituições financeiras, aproximando desejo e realização aos olhos e bolso do consumidor, como fazem as Casas Bahia. Ganhar pouco sobre grandes volumes, como um Wal-Mart, ou muito sobre quantidades reduzidas, tal qual Louis Vuitton e todo o ascendente mercado do luxo.
Promoção
Adeus aos testemunhais e às ações de merchandising. A inovação da promoção se traduz por ações com impacto cultural, permeando o estilo de vida das pessoas. Estar onde o público quer e na hora em que ele precisa. E utilizar uma comunicação clara, facilitando a compreensão; convincente, digna de credibilidade; e sedutora, alinhada com as experiências de vida dos clientes potenciais.
Praça
Não é mais sobre onde está armazenado o produto e onde será entregue. Trata-se dos canais para encontrá-lo, como personalizá-lo e, eventualmente, consertá-lo. Trata-se de comodidade e velocidade. Acessar o Submarino no final da noite e receber um livro ou CD no dia seguinte. E toda a logística existente por trás disso.
Pessoas
Estamos falando dos consumidores, certo? Em parte. Estes são os chamados clientes externos, os quais precisamos estudar, conhecer e questionar. Mas há também os clientes internos, não apenas enquanto funcionários, mas enquanto porta-vozes de toda a corporação. Ou sua equipe acredita e confia na organização em que trabalha, nas pessoas e nos seus produtos e serviços, ou o abismo está próximo.
Pós-Venda
O difícil não é a primeira venda, mas a segunda. Fazer o cliente voltar – e não para apresentar reclamações. Estabelecer um vínculo emocional capaz de torná-lo seu embaixador itinerante, propagandista dos benefícios de sua empresa. Alcançar fidelização, lealdade e perenidade.
Processo
A eficiência da produção seriada cedeu espaço para a eficácia da produção personalizada engendrada pela Dell. Já a Federal Express transmutou-se de uma empresa de encomendas para uma companhia de logística. E a Starbucks foi além de bons grãos e variedades de cafés, bem preparados por exímios baristas. Converteu seu espaço num ambiente de convívio social, praticando o inovador marketing de experiência.
3. Superar o medo e administrar o risco
“Houve momentos em que pensei que poderíamos falhar.
Houve momentos em que até pensei que deveríamos falhar.
Mas, por alguma razão, nunca pensei que falharíamos.”
(Phil Knight, Nike)
O maior medo a confrontar os inovadores não é o medo de errar, mas o de não tentar ou, ainda, ser suplantado por outrem.
O mundo está repleto de idéias. E a grande maioria das pessoas vai levá-las consigo após o suspiro final devido à incapacidade de torná-las tangíveis, colocando-as em prática.
Temos o hábito de ficar esperando pelo mundo perfeito. Queremos controlar o ambiente e as circunstâncias, adotamos a hesitação como parceira e vemos o tempo escorrer pelas mãos e a frustração nos visitar.
O ótimo é inimigo do bom. Por isso, aja! Esteja preparado para errar e acostume-se com o erro. Corra riscos. Se você não o fizer, alguém o fará em seu lugar. Se você tiver medo de falhar, você vai falhar. É como um velho lema dos lutadores de artes marciais: se você teme perder, já está vencido.
Encare o risco, o perigo e o fracasso como adrenalina que acelera o pulso, dilata as pupilas, impulsiona as sinapses proporcionando-lhe uma explosão de prazer por fazer diferente no intuito de fazer a diferença. Como dizem na Intel Capital: “Ser o primeiro entre os piores é melhor do que ser o segundo entre os melhores”. Arrisque. E acredite.
4. Preparar a mente
“A oportunidade favorece a mente preparada.”
(Louis Pasteur)
Os inovadores são pessoas que fazem sua própria sorte. Não acreditam no acaso, mas no trabalho árduo para estarem no lugar certo e na hora certa quando uma oportunidade surgir.
A Roda do Aprendizado, formulada por Peter Senge, é exemplar para ilustrar este conceito. A primeira fase reside no plano da consciência, o que envolve percepção e observação. Consiste em ter a mente aberta, estar atento ao mundo, ao ambiente que nos cerca, captando inclusive intuitivamente informações que ganharão significação, recebendo status de conhecimento.
A segunda fase é representada pelo plano da competência. Após o reconhecimento, sucede a ação, enérgica e flexível, levando à experimentação, habilitação e, por fim, à incorporação – in corpore, ou seja, tornar parte de si.
Na verdade, a célebre frase de Pasteur foi assertivamente reescrita por Michael Schrage: “A mente preparada favorece a oportunidade”.
5. O funil da inovação
“O melhor modo de ter uma boa idéia é ter muitas.”
(Linus Pauling)
Divergência e convergência. Estas são as palavras-chaves no processo criativo.
Começamos pela divergência. É fácil compreendê-la a partir da aplicação da tão conhecida técnica de brainstorming. Neste estágio, buscamos a quantidade. Uma profusão de idéias, muitas delas desconexas. O julgamento deve ser suspenso, tudo deve ser permitido. Regra básica: é proibido proibir. A participação de todos deve ser estimulada e o humor deve permear as relações.
A cada uma das idéias lançadas, podemos aplicar outra ferramenta, o SCAMPER, um acrônimo para ilustrar um conjunto de ações para ampliar ou gerar novas idéias:
- Substituir: regras, materiais, processos, abordagens;
- Combinar: idéias, soluções, variações, realizar misturas;
- Adaptar: copiar, reproduzir, agrupar, incorporar;
- Maximizar: ampliar, expandir, agregar, adicionar, exagerar;
- Pode usar: novos usos, aplicações;
- Eliminar: simplificar, condensar, subtrair, apagar;
- Rearranjar: novas distribuições, componentes, cronogramas, procedimentos.
Depois passamos à avaliação, etapa na qual as idéias são classificadas e organizadas. Sistemas de banco de dados são particularmente úteis neste momento.
A partir desta fase, tem início o processo de convergência. Pesquisas são realizadas para avaliar a viabilidade das principais idéias selecionadas. Protótipos são construídos e testados. Até chegarmos, finalmente, ao lançamento, a realidade da inovação.
Da criação ao lançamento, o processo da inovação assemelha-se a um grande funil. Partimos de um grande número de idéias, que demandam poucos recursos, para chegarmos a uma única idéia exeqüível, a qual demanda grande volume de recursos de toda ordem.
6. Inventar o futuro
“Você precisa ser a mudança que deseja ver.”
(Mahatma Gandhi)
O desafio agora é explorar o futuro. Pensar, repensar, reinventar. Não apenas objetos e processos, mas a si mesmo. Dar asas à imaginação. Fechar os olhos e vislumbrar cenários e tendências.
Leia livros e revistas que normalmente não circulariam em suas mãos. Assista a programas diversos, sejam desenhos animados ou documentários. Leia o jornal de trás para diante, passeie seus olhos pelos classificados, detenha-se nas notícias de menor destaque – tudo o que se encontra nas manchetes e nas primeiras páginas fazem parte do universo do conhecimento comum.
Veja filmes de ficção e faça perguntas. Muitas perguntas. Visualize o mundo em cinco, dez, vinte anos. Busque o inusitado. Assuma desafios não razoáveis, que pareçam mesmo impossíveis. E descubra com rapidez que eram perfeitamente plausíveis.
7. Criar uma cultura de inovação
“Se quiser colaboração, remova as paredes.”
(Sohrab Vossoughi)
A cultura da inovação deve permear todos os matizes de sua companhia. Para tanto, crie um ambiente propício para encorajar novas idéias. Facilite e propicie a comunicação em sua equipe. Promova eventos, organize almoços, leve-os para fora da empresa, saindo do lugar convencional de trabalho. Reduza as hierarquias, não apenas por decreto, mas de fato.
Além disso, estimule o humor e as brincadeiras. Assim estará contribuindo para o aprendizado e a qualidade de sua retenção. Divertir-se é um ótimo recurso para manter a auto-estima e motivação elevada.
E lembre-se de agir em consonância com suas palavras. Alinhar comportamento e discurso. A isso chamamos coerência.
8. O poder da diversidade
“Nem todas as conversas irão mudar sua vida,
mas qualquer uma delas poderá fazê-lo.”
(Liz Dolan)
Colaboração e diversidade são essenciais para a inovação.
A colaboração traz consigo o respeito, a assertividade, a certeza de que nenhum de nós é tão bom quanto todos nós. Da colaboração surge o conceito de comunidade, o lugar onde as idéias recebem apoio e incentivo – porque são comuns aos propósitos de todos.
A diversidade transcende à imagem de multiplicidade racial, religiosa ou social. Reduz-se simplesmente à diversidade e pensamento. Pontos de vista diferentes que conduzem a novas idéias, ou as idéias existentes a novos caminhos.
O florescer desta diversidade demanda diálogo. Mais do que ouvir, escutar. Colocar o ego do lado de fora da arena. Nada de posições, cargos, títulos. A conversação entre iguais, marcada pela honestidade, confiança, independência, intuição e emoção.
Aproveite pequenos encontros sociais para debater idéias. Converse mais com as pessoas, inclusive estranhos. É uma grande oportunidade para conhecer outras perspectivas.
9. Qual é o seu problema?
“Eu quero tornar a eletricidade tão barata
que somente os ricos possam dar-se ao luxo de queimar velas.”
(Thomas Edison)
Buscamos a inovação não de forma despretensiosa, mas para atingir determinados objetivos. Pode ser reduzir custos, aumentar a durabilidade, ganhar mais intensidade, proporcionar mais beleza, conquistar maior funcionalidade. Enfim, mudar positivamente o resultado atual a partir dos recursos existentes.
Por isso, após a pergunta fundamental “Qual é o seu problema?” sucede uma ainda mais relevante: “O que você vai fazer a respeito?”
Por Tom Coelho, Colunista do EmpresasVALE
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